O início do século XVII testemunhou aquela que foi talvez a maior revolução na História da Música. A descoberta da monodia acompanhada e a invenção da ópera estenderam rapidamente a sua influência à música sacra, sobretudo no norte de Itália. A polifonia nunca foi totalmente abandonada, mas o novo estilo – ou «seconda pratica» impôs-se como gosto dominante, ao permitir uma abordagem livre, pessoal, francamente emocional e expressiva dos textos litúrgicos ou devocionais. A combinação de duas vozes agudas sobre um baixo de acompanhamento permitia uma grande flexibilidade e variedade de texturas, ora imitativas ora declamativas, bem como a exploração de uma sonoridade que combina o a elevação angelical com uma nem sempre discreta voluptuosidade, sobretudo nas poesias mais afectadas pela ardência emocional barroca.
Seleccionamos uma série de obras aptas para o tempo litúrgico do Natal, que combinam excertos dos Salmos e de outros livros bíblicos e fontes litúrgicas, com poesia neo-latina, rica em expressões de afecto e efeitos dramáticos, suscitando uma nova forma de expressão, particularmente efectiva quando aliada a um estilo de música com tanto de sacro como de sensual. As obras são de alguns dos autores mais relevantes deste período (Monteverdi, Frescobaldi, Rovetta, Merula, Banchieri) mas também de quatro freiras compositoras muito menos conhecidas (Cozzolani, Leonarda, Rusca e Vizana) num esforço de recuperação e divulgação de um repertório de grande valor estético, e muito adequado a esta época festiva.
