PT Galeria Ana Lama Apresenta o ciclo Fake Extreme Art em diferentes lugares de Lisboa com sessões mensais num formato presencial e digital a próxima performance será Making of #3 com Kamil Guenatri (Argélia/França) na manhã de Sexta 8 de outubro longa duração 11h00-14h00 as performances são registadas em vídeo com um público convidado (Making of) em lugares emblemáticos da cidade a próxima performance irá acontecer num espaço público aberto a todos, o Mercado de Alvalade, agradecemos no entanto que marquem presença através do mail: galeriaanalama@gmail.com os registos são editados e preparados para serem exibidos digitalmente na website da galeria com estreias mensais EN Ana Lama Gallery presents the cycle Fake Extreme Art with monthly sessions in various spaces in Lisbon. In person live event and digital format The next performance will be Making of #3 with Kamil Guenatri (Algeria/France) on Friday morning October 8th long duration 11h00-14h00 The performances are recorded on video with a guest audience (Making of) in emblematic places in Lisbon Although the next performance will take place in an open public space, the Alvalade Market, please make a reservation by contacting us by e-mail: galeriaanalama@gmail.com The recordings are edited and will be available digitally on the gallery's website with monthly premieres. PT Poeta e performer, Kamil Guenatri, argelino e francês, trabalha nas suas performances o tema da doença, motivado pela incapacidade motora de que é portador. Uma pergunta salta à vista do espectador: como pode Guenatri ser performer tendo claras dificuldades de locomoção no dia a dia? Ajudado por assistentes, joga com esses limites do corpo entre a imobilidade e o movimento, o aprisionamento e a liberdade, percebendo-se a beleza pungente dessas qualidades contrastadas. Qui légitime l’art contemporain? Era o que ele tinha escrito na sua T-shirt branca, na primeira vez que o vi. Usa o seu corpo, a sua condição frágil, como veículo para enfrentar preconceitos sociais face a uma physical disability; propõe com as suas ações poéticas suplantar a representação da dor e do sofrimento; propõe como dispositivo performativo instalativo, com a beleza diáfana com que dispõe aí do seu corpo, que se faça notar uma vontade pulsante de vida. Kamil Guanatri é o performer mais corajoso que existe e o último samurai dos mares. Qui légitime l’art contemporain? O samurai Kamil detém o recorde de tempo contínuo em performance num palco marítimo. Esteve 45 dias num veleiro, numa ação duracional, num convés. Para a montagem do projeto artístico, foi ajudado pela tripulação do navio, experiente e apaixonada pela vida no mar. Nessa performance a bordo de um veleiro, depois dos 45 dias dedicados ao projeto, continuaria viagem dando a volta ao mundo. A jornada foi muito dura. Ainda hoje, quase sete anos depois, não recuperou totalmente a massa muscular perdida nem a amplitude dos movimentos do tornozelo ou a sensibilidade da região lombar. Ainda sente dores quase diariamente, resultado desse processo. A viagem começou em maio de 2013 no veleiro/cruzeiro de 53 pés, o Jeanneau. Velejou de Ramsgate (Reino Unido) a Portugal, parando em várias cidades ao longo da costa norte de França e de Espanha, regressando a Ramsgate. Lembra-se de que uma dessas noites estava calma – que, quando passavam o estreito de Gibraltar, lhe foi possível ver plânctons bioluminescentes, azulados, ao redor do barco, mais alguns peixes solitários nadando ao seu redor. Que nessa noite parecia haver muito mais estrelas no céu (quando estamos no mar, parece sempre que existem mais estrelas). Disse-nos que, estando afastados das luzes das cidades, e sentindo a importância das roupas térmicas, já que ficava muito frio no cockpit durante a noite quando em alto-mar, que nessa noite sentiu uma paz imensa. Era 24 de dezembro de 2014 e foi o último dia da performance a bordo. – Qui légitime l’art contemporain, my body is manufacturing plant of poetry and actions, cette merde que je fais est une chose importante!? O veleiro tinha estes dizeres escritos na vela, o que poderia parecer uma interrogação elitista por parte de quem da costa visse o barco, sendo que a intenção de Kamil não era essa, mas o seu absoluto contrário. A meio da performance, a 24 de junho, o barco ficou à deriva porque o comandante adoeceu. A tripulação tinha de tomar um especial cuidado para subir de volta ao convés quando se revezava por turnos – já que o barco balançava violentamente. Kamil estava disposto de forma ventral no porão; começou a enjoar, teve que se conter e de se deitar no convés até que o barco, com o comandante recomposto, retomou a navegação. Felizmente, o enjoo passou. Qui légitime l’art contemporain? Art of living e formas não aparentes de meditação como legitimation strategies in art; falámos sobre isto em 2018, na última visita que nos fez em Portugal. Isto da legitimação em arte é um grito fechado. Na verdade, há uma coisa que nos dias de hoje perdeu muita importância – a procura das subjetividades interiores. Estamos, antes e sobretudo, a pensar na nossa função enquanto seres vivos e em como essa função perdura; a questão das utilidades e o que representamos para os outros em sociedade – estas utilidades perduram, e isso dá autoestima. O comprimento de onda, uma onda psíquica, é como uma função de calma e tranquilidade; a arte e os seus processos como que se cumprem, fechados ou abertos, e parece que hoje se apela menos aos estados de alma e à contemplação. Seria adorável que toda a gente tivesse a mesma boa vontade de Timothy Morton quando escreveu um livro, o All Art is Ecological. Em determinada altura, no livro, Morton define ecologia como a capacidade de se viver de forma não violenta com seres não humanos. Mas o que é isto da paz ou da atenção para com seres não humanos? Para um artista, não é fácil manter certezas e todos os métodos ecológicos e todas as temáticas são transitórios – os temas e os conceitos, só por si, podem ser redutores. A arte, ao contrário da ciência, foge de ser contida na razão. Temos dúvidas, e muitos objetos de arte caem num limbo ético justificado e injustificado na terapia, numa injustificação que se abre ante o tempo como experiência. A maior parte das performances – talvez – fala numa reciclagem do tempo individualíssimo, quando se trata de experiências sinceras de arte. Recicla-se o tempo com algumas ações artísticas, porque o performer propõe que parte da experiência se abra ao que vai acontecer como improviso, isso abre o tempo; e também o espectador comunga dessa adrenalina sem saber o que vai acontecer. O tempo, hoje, é comido como um alimento superprocessado, e a performance, quando se dá à improvisação, ajuda a encarar o stress da vida contemporânea. O tempo, terapêutica que a arte nos abre, fechados que estamos – inconscientemente, numa organização de utilidades –, recicla-nos, e algumas vezes enquanto espectadores, faz reset em todo o sistema. A visualidade ganha interesse (falando de artes e performance) quando as formas não humanizadas (o que pode ser toda a matéria à nossa volta, mesmo aquilo que anteriormente eram utensílios humanos), quando esta matéria fica desprogramada, deixa de ser vista de forma utilitária e a relação pré-concebida se desconstrói – e é então que aprendemos novas relações que podem ser poéticas. Para que isto aconteça é preciso estar de mente aberta e quebrar com a normal hierarquia da relação com a matéria; as coisas, aqui, não estão ao serviço do homem, antes tendo qualidades próprias; as coisas estão ao mesmo nível dos humanos. A performance é a contemplação visual em ação, o momento em que se quebra essa hierarquia e em que a mente se encontra com o momento do ato de conhecer. Este estado de concentração dá força às performances e é vivido em comunhão com os públicos – tudo isto pode ser também muito desinteressante, se não se estiver com disposição para um momento contemplativo. Em Lisboa, teme-se recorrentemente o terramoto de 1755 (seguido de maremoto), teme-se que este se venha a repetir. Desde esse ano, Lisboa é conhecida como a cidade marítima aérea (os turistas já acham estranha a tradição lisboeta de deixar botes de borracha no cimo dos edifícios, para o caso de ser necessário usar este meio de transporte). A performance que Kamil nos propõe, aqui em Lisboa, vai ser uma coisa séria, uma performance de longa duração, uma coisa para quatro horas. Apresenta-nos “Becoming The Way, uma experiência e uma ação reflexiva que se estende no tempo, propondo o seu corpo coisificado como interrogação; o corpo é mais um material entre outros materiais. Interage com objetos para assim criar um enunciado, uma proposta poética viva. A performance é composta por ações mínimas repetidas, com variações lentas”. Alandroal, 27/09/2021 Ana Lama. EN Poet and performer, Algerian and French, Kamil Guenatri bases his works on illness, making it the theme of his performances, in which he is motivated by his own motor disability. One question jumps out at the spectator: how can Guenatri be a performer having clear locomotive difficulties in his daily life? With the help of assistants, he plays with the limits of the body; immobility and movement, imprisonment and freedom, realizing the poignant beauty of these contrasted qualities. Qui légitime l'art contemporain? That's what he had written on his white T-shirt the first time I saw him. He uses his body, its fragile condition, as a vehicle to confront social prejudices against disabilities; he proposes with his poetic actions to supplant the representation of pain and suffering; he proposes a performance installation device, with the diaphanous beauty with which he disposes of his body, a pulsating urge to life becomes evident. Kamil Guanatri is the bravest performer and the last samurai of the seas. Who can read contemporary art? The samurai Kamil holds the record for continuous time performing on a maritime stage. He spent 45 days on a sailboat, in a durational action, on a deck. The ship's crew was experienced and passionate about life at sea, and helped him bring his artistic project together. Aboard a sailboat, after the 45 days of his performance, he would continue his trip around the world. The journey was very hard. Even today, almost seven years later, he has not fully recovered the decrease in muscle mass, the range of movement of his ankle, or the sensitivity of his lower back. He still feels pain on a daily basis, as a result of this process. The journey began in May 2013 on the 53-foot sailboat/cruiser, the Jeanneau. It sailed from Ramsgate (UK) to Portugal, stopping in various towns along the northern coast of France and Spain, and then returning to Ramsgate. He remembers that one of those nights was calm - as they were passing the Strait of Gibraltar, he could see bioluminescent, bluish plankton around the boat, plus a few solitary fish swimming around it. That night there seemed to be many more stars in the sky (when we are at sea, there always seem to be more stars). He told us that being away from the city lights, and appreciating the importance of thermal clothing, as it gets very cold in the cockpit at night when out at sea, that that night he felt an immense peace. It was December 24, 2014 and it was the last day of the performance on board. - Qui légitime l'art contemporain, my body is manufacturing plant of poetry and actions, cette merde que je fais est une chose importante!? The sailboat had these words written on the sail, which might seem like an elitist interrogation to those who saw the boat from the shore, but Kamil's intention was not that, but the absolute opposite. In the middle of the performance, on June 24, the boat was adrift because the captain fell ill. The crew had to take special care to climb back on deck when taking turns - as the boat rocked violently. Kamil was laid out ventrally in the hold; he began to feel seasick, had to restrain himself he lay on deck until the boat resumed sailing with the recovered captain. Fortunately, the seasickness passed. Qui légitime l'art contemporain? We talked about Art of living and non-apparent forms of meditation as in legitimation strategies in art in 2018, on his last visit to Portugal. This legitimation thing in art is a hollow scream. In fact, there is one thing that has lost a lot of importance these days - the search for inner subjectivities. We are, first and foremost, thinking about our function as living beings and how that function endures; the question of utilities and what we represent to others in society - these utilities endure, and that provides self-esteem. Wavelength, a psychic wave, is like a function of calm and tranquility; art and its processes sort of fulfill, closed or open, and it seems that today one appeals less to inner states and contemplation. It would be lovely if everyone had the same goodwill as Timothy Morton when he wrote the book All Art is Ecological. At one point in the book, Morton defines ecology as the ability to live non-violently with non-human beings. But what is this peace or mindfulness towards non-human beings? For an artist, it is not easy to maintain certainties, and all ecological methods and all themes are transitory - the themes and concepts alone can be reductive. Art, unlike science, escapes being contained within reason. We have doubts, and many art objects fall into a justified and unjustified ethical limbo in therapy, an unjustifiable element that allows us the experience of time. Most performances - perhaps - talk about a recycling of individual time, when it comes to sincere experiences of art. Time is recycled with some artistic actions, because the performer proposes that part of the experience opens up to what is going to happen as an improvisation, this opens up time; and also the spectator shares this adrenaline without knowing what is going to happen. Time, today, is eaten like an over-processed food, and performance, when it gives itself to improvisation, helps to face the stress of contemporary life. Time, as a therapeutic element, that art opens up to us, closed off as we are - unconsciously in an organization of functionalities - recycles us, and sometimes as spectators, the whole system. Visualities gain interest (talking about arts and performance) when non-humanized forms (which can be all the matter around us, even what were previously human utensils), when this matter becomes deprogrammed, and are no longer seen in a utilitarian way and the preconceived relationship is deconstructed - and then we are open to new relationships that can be poetic. For this to happen, it is necessary to be open-minded and break with the normal hierarchy of the relationship with matter; things, here, are not at the service of man, but have qualities of their own; things are on the same level as humans. The performance is visual contemplation in action, the moment when this hierarchy is broken and the mind meets the moment of the act of knowing. This state of concentration gives strength to the performances and is experienced in communion with the audience - all of which can also be very uninteresting if one is not in the mood for a contemplative moment. In Lisbon, the earthquake of 1755 (followed by a tsunami) is recurrently feared, the fear is that it could happen again. Since that year, Lisbon has been known as the aerial maritime city (tourists find it strange that in Lisbon there is a tradition of leaving rubber boats on the top of buildings, in case it is necessary to use this means of transportation). The performance Kamil proposes here in Lisbon will be a serious thing, a long duration performance, something for four hours. He will present us with: Becoming The Way, an experience and a reflexive action that extends in time, proposing his objectified body as an interrogation; the body is one more material among other materials. It interacts with objects to create a statement, a living poetic proposal. The performance is composed of minimal repeated actions, with slow variations". Alandroal, 27/09/2021 Ana Lama. *parceria institucional República Portuguesa – Ministério da Cultura, Câmara Municipal de Lisboa, Polo Cultural das Gaivotas, Junta de Freguesia de Alvalade e Plataforma P´LA ARTE *Institutional partnership Portuguese Republic –Ministry of Culture, Lisbon City Hall, Boavista Cultural Center, Alvalade Borough Council and Plataforma P'LA ARTE