O desejo de revisitação de lugares felizes é absolutamente irreprimível. O permanente diálogo com o outro lado do espelho, uma tentação. As possibilidades de “Alice” são infinitas. A sedução de explorar todos os recantos do Universo “aliciano“ de Lewis Carrol é, essencialmente, o revolver de um universo não canónico, a exploração de uma nova avenida para o abismo, sem medo do absurdo que tantas e tantas vezes anda de mão dada com o quotidiano e trivial. É essa tentativa de resgate do tempo mítico da infância - neste hiato entre realidade e ficção, profuso em imagens tão vividas quão aterradoras - que nos propele a tentar cartografar esse território desconhecido. Percebendo, de antemão, a dificuldade inerente a tal empreitada,num universo de possibilidades interpretativas fluídas, de diálogos permanente abertos (com todas as formas de media), resta propormo-nos a uma excisão simples daquilo que é a representação pessoal da obra, coalescida numa série de recortes exemplificativos de passagens da obra. Surge daí a ideia de uma série de retratos de família, como medida íntima das pulsões e desejos de cada personagem: a representação possível do enigma que cada um representa. Há, também, na técnica escolhida, um desejo de catarse, uma desconstrução da mitografia encerrada num universo alargado e uma ponderação do significante quadro de estruturas para-familiares que ligam os representados. Ficcionam-se, assim, as ligações genealógicas, construindo um novo sentido narrativo, deslindando uma nova camada interpretativa – porque se Alice não é um jogo de subtracções, não o será também um de simples somas. É a ideia do múltiplo que perpassa toda a série. A figuração multíplice de uma menina sentada num estúdio fotográfico, de uma jovem colocada, nua, vergada perante o jugo da problemática do existir.