A Carta a El-Rei Dom Manuel sobre o Achamento do Brasil, Carta do Achamento do Brasil ou Carta de Pêro Vaz de Caminha, conforme é conhecida, assinala um momento singular da História. A exposição em Belmonte do documento inscrito desde 2005 pela UNESCO no Registo da Memória do Mundo celebra a ligação da localidade a este episódio ímpar na história universal, enquanto berço do capitão da expedição que realizou este feito. Trata-se do primeiro testemunho da existência de um mundo até então desconhecido dos povos e o primeiro testemunho dessa nova realidade, (d)escrita no período crucial dos Descobrimentos, esse tempo em que a ciência náutica finalmente tornou possível fazer o reconhecimento do nosso planeta. O olhar ‘maravilhado’ patente neste texto resulta da descoberta do ‘outro’, sendo capaz de transcender os cânones a que relatos de viagens, bestiários e outras efabulações habituaram os Europeus desde a decadência do Império Romano e ao longo de toda a Idade Média. A exposição pretende fazer um contraponto entre o carácter efabulatório da cartografia pré-era dos Descobrimentos e o levantamento exaustivo efetuado pelos Portugueses nas suas incursões por territórios mais ou menos conhecidos, como África ou as Índias Orientais, e depois, no Novo Mundo, do qual o relato de Pêro Vaz de Caminha é o momento inaugural. A instalação presente no primeiro espaço é a iluminação perfeita face a esse imaginário das descobertas e à perceção da transformação de um mundo considerado imutável num mundo em mudança, no exato momento em que se vão conhecendo os seus verdadeiros limites físicos. Recriado para esta exposição, o trabalho da dupla italiana Carnosvky resulta numa instalação visual, onde toda uma iconografia de mapas, seres e realidades imaginadas emerge através de um dispositivo de cores Red/Vermelho – Green/Verde – Blue/Azul. O espaço reservado à leitura da Carta alarga-se através da sonoplastia realizada por Sílvio Rosado, que funciona como tapete sonoro da exposição, espécie de áudio-guia de uma viagem e de uma descoberta, onde foram protagonistas os alunos mais pequenos da Escola de Música de Belmonte. A contextualização histórica é feita através da incorporação de peças que integram o acervo de dois museus nacionais e de uma das mais relevantes coleções privadas de arte antiga, que permite ao público o contato visual com objetos coevos de Pêro Vaz de Caminha e Pedro Álvares Cabral. As imagens religiosas, similares às figuras devocionais presentes nas residências reais ou nas grandes casas da nobreza europeia e os azulejos do Palácio de Sintra exprimem as grandes realizações estéticas dos séculos XV e XVI, o período em que viveram o cronista e o comandante da armada que chegou ao Brasil, e dão o testemunho do entorno estético e cultural do Portugal dos Descobrimentos.