O CARRO À FRENTE DOS BOIS Estamos perante uma realidade de que ignoramos a substancia. Protagonizamos uma personagem que se desconhece. No entanto, devemos a cada passo tomar decisões que nos definem. O labirinto de incompetência que sem cessar exercemos, pode, a cada momento, abandonar-nos para que fiquemos confrontados com a única certeza. Reconhecemos nesse instante a plenitude imperdível. A bidimensionalidade que é apanágio da pintura projecta-nos paradoxalmente para além da aparente dualidade temporal. Para que tal possa ser vivido devemos prescindir tanto de certezas como de hábitos. É retrospectivamente que vejo confirmados os princípios orientadores duma percepção válida e abrangente. De outro modo seria como “pôr o carro à frente dos bois”… RECEITA (…) Andar à volta da [tela] pousada no chão: é branca e ignora alto e baixo. Ao descobrir um ponto fraco (ou acolhedor?): usar um pincel carregado de tinta (…). O ataque (ou carícia) ficará marcado, visível. Baralhar as pistas. Trocar as voltas ao acaso. Destruir tudo. Escutar a luz. Quando tudo está partido, tudo se segura: insuportável gratificação. Voltar as costas. Opressivo, o reverso da sedução? VP 1977 Pág. 108/9 Vol. II “O Meu Campo de Batalha”, Catálogo Museu de Serralves 2003 AUSTERIDADES Podemos, entretanto, exercitar-nos em alguns e pertinentes jogos, tais como: Abandonar a austeridade de nos privarmos de nós próprios (e dos outros), resultante principalmente da educação e do consumo de bens e dos ‘media’. Abandonar a austeridade de nos submetermos às construções mentais nas suas variadas formas e de nos privarmos da alegria e da vastidão do espaço mental. Praticar a austeridade da “felicidade como caminho e não como fim”. (…) VP 2001 idem pág. 113 The nature of multiplicity is nondual and things in themselves are pure and simple. Being here and now is construct free and it shines out in all forms, always all good; it is already perfect, so exertion is redundant and spontaneity is ever-immanent. A natureza da multiplicidade é não-dual, e as coisas por si mesmas são puras e simples — estar aqui e agora é livremente constituído e é radiante em todas as formas — numa boa — acontece já perfeito — qualquer empenho é redundante e a espontaneidade é sempre imanente VP 2014, “AO PEQUENO-ALMOÇO COM A NÃO-DUALIDADE 108 compotas” (www.vitorpomar.com), Nr 15. The Cuckoo's Song of Gnosis, “Eye of the Storm” by Vairotsana, Tibete, sec. XIII/IV, tradução e comentário Keith Dowman CV Aos 21 anos cheguei à Holanda como refugiado e refractário ao exército português, então comprometido com uma guerra colonial que haveria, quatro anos depois, de dar origem ao chamado ’25 de Abril’. Foi com 42 anos que cheguei à Índia pela primeira vez, onde permaneci cerca de ano e meio, distribuídos por 3 anos e onde tive oportunidade de receber inúmeros ensinamentos no quadro do budismo tibetano e prosseguir alguns retiros solitários. Sinto-me hoje como que sentado em diversas cadeiras, a saber as artes plásticas tal como são entendidas no ocidente, e a espiritualidade, nas suas diversas vertentes, desde o Zen ao tantra cachemiriano e ao dzogchen, a que em boa hora se veio juntar alguma aproximação ao xamanismo e às culturas nativas não escritas. Vítor Pomar nasceu em Lisboa em 1949, vive e trabalha em Assentiz, Rio Maior. Entre as exposições individuais mais recentes destacam-se “In Love With The Universe”, Espaço Concas | Centro de Artes | Caldas da Rainha, 2015 “Apparent But Nonexistent” na Galeria Pedro Cera, Lisboa 2014 “Uma Pátria Assim.../ Such a Homeland...”, Museu da Eletricidade, Lisboa, 2012 "Karma Mudra", TMG Guarda 2012. “Nada para fazer nem sítio a onde ir”, CAM – Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2011 "Os Atributos do Ar /The Attributes of Air”, Galeria Bloco 103, Lisboa. 2011 Só Acredito em Milagres/I Only Believe in Miracles, Centro Cultural de Cascais 2008 2007-- Ilha do Tesouro, Galeria Antiks Design, Lisboa. “My Own Battlefield (O Meu Campo de Batalha)”, Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Porto, 2003. Slow Motion: Art Attack + Estgad, Caldas da Rainha Participou no Congresso “Arte e Género?” que decorreu na Fundação Calouste Gulbenkian e no Museu Vieira da Silva, onde apresentou a comunicação intitulada “Je t’aime, je te mange, je te tue”, Lisboa 2014. Participa no Colóquio “Vita Contemplativa”, a 19 de Outubro 2015, na Faculdade de Letras de Lisboa, com uma comunicação intitulada “”Não se pode dar de beber a um burro que não tem sede”