O autor revisita, através das suas composições fotográficas, expostas em forma de sequências cinematográficas, autênticos ecrãs de movimento poético e de tensão dramática, um acontecimento famoso da História da época clássica conhecida por Idos de Março. A expressão Idos de Março designa o dia 15 do mês de Março do ano 44 a.C., dia em que Caio Júlio César, desprezando todos os avisos de que nesse dia se realizaria um atentado contra a sua vida, dirigiu-se para o Senado sendo brutalmente assassinado por um grupo de senadores próximos das suas relações, entre os quais se encontrava o seu filho adoptivo Brutus. A escolha deste episódio da História de Roma como o objecto da exposição, é tudo menos acidental, pois que o mês de Março constitui uma marca trágica no percurso pessoal do autor. Em Idos de Março, André Gomes entrelaça as vivências íntimas da sua história com esses impressionantes momentos da História, criando ainda personagens fictícias que correspondem a figuras reais: o velho sentado no parque falando com a estátua, a artista pintando a águia em sangue, representam respectivamente o adivinho Espurina que avisou César dos perigos que o esperavam no dia 15 de Março, e Calpúrnia, a mulher de César, cujos pesadelos nocturnos eram presságios da tragédia. Estas personagens são as pedras basilares que estruturam poeticamente o edifício narrativo, bem como a ideia pitagórica da transmigração das almas e a reflexão sobre a essência do Ser do Homem e da sua fragilidade tal como a pensou Marco Aurélio. O triunfo do destino cruel despertando o Homem dos seus devaneios de poder, riqueza e fama, é outro dos fios de Ariana que conduzem a leitura das sequências fotográficas, incorporando nas imagens o sentimento de uma anunciada ameaça individual (o pressentimento do perigo), bem como a previsibilidade de uma tragédia colectiva (a guerra civil). As duas últimas fotografias do capítulo III,intitulado “Idos de Março”, representam o episódio narrado pelo historiador Suetónio, que refere, que nos céus de Roma brilhou durante sete dias, durante as festas de homenagem a César pelo seu sucessor, um cometa que todos creram ser alma de César, pois este havia sido divinizado após a sua morte. Como que a condensar o espírito trágico e o assombramento mágico presente em toda a exposição, são de referir ainda as duas instalações de objectos inspiradas respectivamente em Buñuel e no poeta inglês Shelley sobre a morte.