Entrada: 8€ | Bilhetes disponíveis na Flur Discos, Tabacaria Martins e ZDB (quarta a sábado 19h-02h) | reservas@zedosbois.org Moor Mother Contas feitas, somam-se quase uma centena de registos audio online ao longo da última década. O número em si impressiona, mas acrescente-se as inúmeras actuações, colaborações e eventos por si organizados ao longo desse feixe temporal e a noção total da obra ascende um grau inimaginável. Camae Ayewa é pois uma força criativa constante e imprevisível, avessa a uma categorização, seja ela qual for. Poeta, activista, programadora – mais uma série papéis que se entrecruzam no caminho – foi porém com a música que o seu nome emergiu em 2016. Moor Mother é o veículo com que se move na experimentação sonora e que acaba por abarcar todas as suas vertentes. É uma veterana no círculo artístico de Filadélfia e genuína luminária na franja vanguardista norte-americana, mas o mais recente álbum ‘Fetish Bones’ resgatou-a das galerias subterrâneas para a levar uma intensa e crescente visibilidade em diversos palcos por todo o mundo. Trata-se da magia transformadora de um disco profundamente comprometido com uma ética socio-cultural progressista, tão essencial neste tempo. Numa América presentemente perdida num nevoeiro chamado Trump, ‘Fetish Bones’ é uma bala na cabeça de muitos – e uma semente na de tantos outros. O tema político é pois um elemento indissociável à sua arte. Nem o poderia ser de outra forma, indiferente ou moderado, quando afinal a sua expressão é um canal de sobrevivência, de denúncia e de transformação (tanta quanto nos permitamos sonhar). Discípula de uma geração de pensadores revolucionários como W. E. B. Du Bois ou Sun Ra, a expressão afrofuturismo surge como tentativa, incompleta é certo, de melhor entender a extensão e complexidade de Moor Mother. No quadro musical partilha a tela cósmica de contemporâneos como Matana Roberts, Shabazz Palaces ou Hieroglyphic Being – todos eles ligados uma sensibilidade comunal, assente na faísca de questionar, denunciar e reimaginar a esfera da realidade em seu redor. Existe claro uma sombra histórica omnipresente neste percurso; o eterno processo de lutas sociais, crimes humanitários e ausência de uma consciência de poder. Fá-lo sem moralidade, demonstrando-o com a vida que vive – e com a criação que produz. Uma vez mais ‘Fetish Bones’ assume-se como ex-líbris de uma longa montra de exercícios demasiado importantes para se confinarem a meras extravagâncias de uma página de Bandcamp. Estilísticamente aborda pontos musicais díspares, dificeis de imaginá-los em plena convergência. Se as pistas do free-jazz dos 60s dão mote natural a essa torrente, não há-que esquecer o legado do punk e a brutalidade expressiva do noise. Até traços de house e rap crepitam na combustão de Moor Mother – e parece haver espaço para tudo. A atitude confrontacional e a essência inclusiva com que expõe estórias e factos, mártires e personagens, incute uma intensidade vulcânica à narrativa que alimenta as suas peças. Munida de um vasto equipamento analógico, as palavras de angústia e urgência interagem com um caos organizado de electricidade granular, gravações de campo diversas ou ritmos fabris infernais – e escutam-se as reverbações de Whitehouse ou Prurient. Cada disco é uma performance sensorial, não menos que imponente em todo o esplendor. Serve os propósitos que afinal busca desde a sua génese: provocar, agitar, transmutar. É assim a poesia do ruído de Moor Mother, o maior cometa que visitará Lisboa nos próximos tempos. NA JOANA DA CONCEIÇÃO Estreia absoluta de Joana da Conceição (Tropa Macaca) a solo.