Município da Maia
Câmara Municipal da Maia Pr. Prof. Dr. José Vieira de Carvalho - Maia Ver website
4, 6, 18 e 20 de abril
Auditório Municipal Venepor
Cineclube da Maia
Enquadrado no programa cultural que assinala as comemorações dos 50 anos do 25 de abril na Câmara Municipal da Maia, o Cineclube da Maia apresenta em abril um ciclo de cinema exclusivo, a ter lugar no Auditório Municipal Venepor.
O programa propõe um conjunto de quatro sessões comentadas, dando acesso a obras realizadas durante a década de 1970. Um retrato multifacetado do período que antecedeu e se sucedeu à revolução de abril, indo do documentário à ficção, do boletim informativo à propaganda política.
Realizadas em parceria com a Cinemateca Portuguesa, no âmbito do projeto Imagens em Movimento – Cinema Português em Diálogo.
4 abril, 21h30
"Cenas da Luta de Classes em Portugal", de Robert Kramer e Philip Spinelli | apresentado por Maria João Madeira
6 abril, 21h30
"O Recado", de José Fonseca e Costa | apresentado por Maria João Madeira
18 abril, 21h30
"Cravos de Abril", de Ricardo Costa; "As Desventuras de Drácula Von Barreto nas Terras da Reforma Agrária", de Célula de Cinema do PCP; "Jornal Cinematográfico Nacional - n.º 1, 8, 9 e 16", de Unidade de Produção Cinematográfica n.º 1 | apresentado por Hugo Barreira
20 abril, 21h30
"As Armas e o Povo", de Colectivo dos Trabalhadores da Actividade Cinematográfica | apresentado por Paulo Cunha
Programa
Auditório Municipal Venepor
4 ABRIL, 21h30
“Cenas da Luta de Classes em Portugal”
Kramer e Spinelli fizeram este filme entre 1975 e 1977. Ouvimos Kramer a pronunciar estas palavras para a câmara após desligar um disco que reconhecemos a fase elétrica de Bob Dylan, a qual transita depois para a voz de José Afonso. Um texto datilografado apresenta-nos a pergunta fácil: porquê dois norte-americanos? A resposta: “porque projetos experimentais” e “projetos radicais” estavam a ser encorajados. Esta é a abertura de um filme que nos transporta para um outro lado da Revolução de Abril. Muitos dos materiais utilizados são os mesmos ou similares aos que vemos em Os Cravos de Abril, As Armas e o Povo ou Bom Povo Português. Aliás, registos fílmicos e sonoros são creditados como provenientes da “Televisão Nacional Portuguesa”. A sequência seguinte é, porém, bem diferente, e lança a tónica de todo o filme: a inserção de um bilhete-postal ilustrado em que, sobre a figura de Salvador Allende, se pode ler: O Povo Chileno Vencerá. O contexto era o recente golpe de estado que instituiu o regime de Augusto Pinochet. Segundo Kramer, esta foi uma das primeiras imagens que ele e Philip viram no Portugal de 1975. Ao contrário da maioria esmagadora dos seus congéneres portugueses, Scenes from the Class Struggle in Portugal é um filme que coloca a Revolução em plena Guerra Fria e numa leitura firmemente vincada em transformações sociopolíticas similares no contexto internacional. Na filmografia de Kramer, o documentário sobre o caso português sucede a um conjunto de produções de natureza documental ou ficcional que debatem sobre as lutas sociais e políticas nos Estados Unidos, demonstrando, desde logo, que o seu principal autor nos dará uma visão marcadamente comprometida na sua análise da ascensão do regime de Salazar, do 25 de Abril e do período subsequente de construção das estruturas democráticas até 1977. Na sua missão e construção narrativa, fechada numa retórica experimentada no ativismo fílmico transatlântico, Kramer consegue um filme que, nas palavras do próprio, se tornaria marcadamente datado. Ao contrário dos congéneres portugueses, em que a vitalidade das imagens e as narrativas elípticas deixam a poiesis sobreviver à techné, o filme de Kramer e Spinelli é assertivamente cioso da leitura das imagens, assumindo quase a dimensão de um thriller de vocação documental. Ironicamente, é nesta tensão entre realidade e ficção que o filme encontra a sua grande valência, muito mais naquilo que inadvertidamente regista, que naquilo que procura deliberadamente documentar. O seu maniqueísmo enraizado na Guerra Fria empresta ao olhar do século XXI uma leitura pouco usual do contexto português, numa perscrutação do devir de um país acabado de (re)nascer num mundo dividido em que todos os cenários são possíveis.
1976 | 90 MIN.
Realização/Director: Robert Kramer e Philip Spinelli
Apresentado por
Maria João Madeira
6 ABRIL, 21h30
“O Recado”
Não podemos escapar, no caso de “O Recado”, da história pessoal de Fonseca e Costa. Ligado ao Partido Comunista e opositor ao regime, o cineasta será várias vezes preso entre o final da década de 50 e início da década de 60, sendo até impedido de assumir um cargo para o qual tinha sido selecionado na RTP. Ele alimentaria, durante a década de 60, a vontade de fazer um “filme de fundo”, mas sem qualquer resultado. Por exemplo, António da Cunha Telles apresentou ao SNI, em 1963, o projeto O Anjo Ancorado, a ser realizado por Fonseca e Costa, a partir de uma novela de José Cardoso Pires. Assim, o cineasta estava já dentro do grupo “fundador” do cinema novo (…), mas terá sido impedido de realizar filmes de fundo mais cedo, concentrando-se em filmes publicitários. “O RECADO” é, por isso, o seu primeiro projeto pessoal, evidenciando algumas das marcas do tempo e da sua luta contra o regime. Aliás, a história da personagem que chega incógnito a Portugal, que fará parte de uma das linhas narrativas do filme, é baseada em factos reais de um amigo exilado de Fonseca e Costa que regressa ao país.
Lúcia (Maria Cabral) é uma maria-rapaz, muito bonita, capaz de se vestir de forma sofisticada e, noutras vezes, desleixada. Ela tem uma personalidade forte na relação com os seus amigos, muitas vezes hostilizando o seu modo de vida. De certa forma, Lúcia não encaixa nos modelos normativos que a sociedade lhe impõe e na qual cresceu. É por isso que ela transita entre António – o empresário jovem bem-sucedido – e Francisco – o exilado político, símbolo de ideais mais puristas. Essa sua ambivalência entre dois modelos masculinos é também a ambivalência do filme: entre uma sociedade burguesa satisfeita com as suas vidas festivas, e uma sociedade oculta, onde persistem problemas sociais e em que há uma necessidade de mudança.
O caráter determinado de Lúcia e até o seu ar arrapazado fazem dela uma personagem forte que põe em causa as representações femininas dominantes de Portugal em finais da década de 60. As cenas que desenvolvem em casa dela são evidência disso mesmo: numa delas, Lúcia ataca, de forma verbalmente contida, a sua amiga Ana, uma típica figura da burguesia lisboeta. Neste caminho, “O RECADO” torna-se um filme claramente político, embora colocado, digamos que estrategicamente, dentro da burguesia.
“O RECADO” é um filme em que se expõe um país em decadência, feito de resistentes, e onde a burguesia é a única classe social a manter-se à tona, numa visão cínica sobre a realidade. O olhar de Fonseca e Costa não podia ser mais desencantado, mas afigura-se, no tom do filme, uma espécie de fim de regime, que estava em linha com o sentimento da sociedade e que conduziria, inevitavelmente, à Revolução de 1974.
Daniel Ribas, Na solidão de um campo de batalha: José Fonseca e Costa, um autor (excerto adaptado), in Catálogo José Fonseca e Costa, Cinemateca Portuguesa, 2016
1971 | 110 MIN.
REALIZAÇÃO/DIRECTOR: José Fonseca e Costa
Apresentado por
Maria João Madeira
18 ABRIL, 21h30
“Cravos de Abril”
“Povo português, vivemos um momento histórico […] como desde os dias de 1640 não se vive”, proclama, junto ao Quartel do Carmo, e ao megafone, Francisco Sousa Tavares, do alto de um carro de combate. Este som, entrecortado pela montagem, viria a integrar o vastíssimo repositório audiovisual da Revolução de Abril de 1974. Cravos de Abril, escrito, produzido e realizado por Ricardo Costa, é considerado o primeiro olhar cinematográfico sobre os materiais audiovisuais da Revolução, preenchendo um arco temporal que, depois de um breve recuo introdutório, organiza uma narrativa sobre os dias compreendidos entre o 25 de Abril e o 1º de Maio de 1974. Embora se trate de um filme a cores, com preciosas sequências coloridas dos principais momentos desses dias, muitas são as imagens a preto e branco, provenientes da inserção de fotografias, ou de captações provenientes da RTP, entre outras fontes. Ricardo Costa apresenta-nos um filme em que a tessitura audiovisual é fragmentária, sincopada, interrompida. As suas imagens e sons não têm a grandiloquência de As Armas e O Povo, não permitem o seu engajamento. A sua montagem é distanciada e firmemente ordenada pelo texto narrado por Eládio Clímaco. Esta vontade de arrumação de material em bruto, que tantos filmes e sequências alimentaria por apropriação ou recriação, em evocações da Revolução, não esconde ou subverte a espontaneidade e o experimentalismo. A muito frequente ausência de sincronização de som e de imagem é disso exemplo, como se a matéria que o filme regista fosse demasiado complexa para ser ordenada, denunciando qualquer tentativa de o fazer como artificial. Sentimos alguns destes ecos em trabalhos futuros de Edgar Pêra, em que o cineasta se denuncia e salienta as propriedades vitais da matéria que compõe o seu ofício. Contrastando com tantas outras “arrumações”, Cravos de Abril não tem música de fundo no sentido convencional. Os seus ritmos sonoros são diegéticos, produzidos pela ação ou com ela sincronizados. Se reconhecemos as vozes de Cunhal ou Soares, é porque os recebemos na sua chegada ao país. Se ouvimos a Grândola, é porque lá estão Zeca, Zé Mário ou Adriano. Muito antes do reel, Ricardo Costa dá-nos um conjunto de instantes, de pequenos clipes destes dias. Mas tal é uma tentação de uma leitura apressada, próxima dos nossos dias. O filme é um exercício de reflexão. A sua narrativa é dividida por um cartoon de Maurice Sinet (Siné), com uma recitação do comunicado do MFA em fundo. Nele se evoca a sucessão de tempos e de poderes. Um marcador discursivo que nos indica que ao primeiro dia muitos se sucederão. A locução, num exercício retórico que toma o pulso da oratória coeva, transmite-nos na sua articulada cadência, a dissonância das imagens rápidas e abrutas, dos cenários cambiantes. No final, uma sucessão de imagens estáticas, outras expressões e documentos da Revolução. Depois do autorretrato abrilesco de Siné, dos cartazes reconhecem-se os de Abel Manta, aos quais os olhares coevos e atuais podem emprestar inúmeras leituras. Dos murais fica a energia latente dos gestos que se esqueceram com o seu desaparecimento. Como no cartoon final de Siné, publicado no Sempre Fixe de 11 de maio de 1974, estamos perante uma dialética, de gerações, de atitudes, de direções, e de vozes a que a bandeira empresta duas cores pouco arbitrárias. O tempo é o do presente, o futuro é ignoto, mas não pertence ainda a um deus.
1999 | 28 MIN.
REALIZAÇÃO/DIRECTOR: Ricardo Costa
“As Desventuras de Drácula Von Barreto nas Terras da Reforma Agrária”
Produzido e realizado pela Célula de Cinema do Partido Comunista Português (PCP) durante a segunda Festa do Avante, em Lisboa, em setembro de 1977, esta curta-metragem de caráter satírico constituí um precioso documento do período de transição social e económica que acompanhou a estabilização do país com os primeiros governos constitucionais. Rodado a cores, em película de 16mm, o filme combina, num experimentalismo sem pretensões, a dramatização oriunda do teatro popular com a apropriação de filmagens documentais de manifestações contra a ação da personagem central, António Barreto (n. 1942), então Ministro da Agricultura e Pescas do I Governo Constitucional, liderado por Mário Soares, após uma passagem pelo Ministério do Comércio e Turismo. O pano de fundo é a chamada Lei Barreto, em oposição ao caminho da Reforma Agrária proposto desde o 25 de Abril pelo PCP e outras forças da esquerda. Comparável ao cartaz ou ao mural político coevos, As Desventuras alimenta-se da mesma energia imagética e plástica para construir uma alegoria à luta contra o fim anunciado da Reforma Agrária através de duas ações paralelas e convergentes. Num primeiro plano, surge a sinistra figura de Von Barreto, ou Von Barrete, como se percebe pelo narrador e pelos desenhos das tarjas de protesto que nos transportam de um mal disfarçado cenário pintado para as ruas do país. Sucede-se, num plano aproximado, a jovem e bela mulher da terra, numa eficiente construção onde se fundem o retrato de um país visível nas reportagens cinematográficas com a sua tipificação oriunda da estética Soviética. A ação adivinha-se, quando este vampiro, em plena personificação dos congéneres de Zeca Afonso, se prepara para atacar a jovem e, com ela, a terra coletivizada.
Nos seus dentes, um bem visível, no forro da sua capa vermelha, este e outros símbolos, como o FMI (Fundo Monetário Internacional) ou a CIP (Confederação da Indústria Portuguesa), revelando as suas motivações obscuras. Antes da abertura da capa do vampiro, interpretado pelo cineasta Henrique Espírito Santo, numa caricatura do Ministro, o filme corta para um plano de um altivo e bem-disposto Henrique Semedo que, contra um fundo urbano de pincelada rápida, onde se distinguem novo $ e as marcas Coca-Cola e Ford, interpreta uma figura sem nome, mas facilmente identificável como o Capitalista. De bengala e cigarro, fazendo a saudação fascista, o Capitalista interage com um tipificado proletário urbano, encantando-o com o seu charme para lhe roubar os frutos do seu trabalho, reforçando a questão de fundo. Distraído o proletariado urbano com bolos, Von Barreto pode atacar, mas, com a intensificação da ação, percebemos que o caráter satírico esconde uma mensagem mais profunda: o esclarecimento do proletariado permite-lhe derrotar o capitalista e marchar em socorro da terra ameaçada. Das várias entradas do campo pintado em cenários de papelão, o proletariado urbano e rural acorre e une-se no cruzamento da foice e do martelo que destroem o vampiro. O novo pano de fundo é a bandeira vermelha do PCP, em raccord com as manifestações que nos transportam novamente da alegoria para o país real e para os derradeiros atos de resistência nas ruas. Neste exercício de retórica imediatista também a música começa por opor, aparentemente, o “erudito” (Beethoven), ou a reação, ao “popular” (Alerta, de José Mário Branco), ou a revolução, na apresentação das personagens, para se apropriar do tema da Quinta Sinfonia numa dupla simbologia de raízes bem marcadas na História do Século XX: a associação das primeiras quatro notas, em Código Morse, ao V da vitória dos Aliados, e a imagem criada pela artista soviética Vera Mukhina, para o Pavilhão Soviético da Exposição de Paris de 1937, em que o Operário e a Mulher Kolkosiana (das unidades de produção coletiva) cruzam a foice e o martelo e defrontam o vizinho Pavilhão da Alemanha Nazi. A simplicidade da sátira e da produção, na sua evidente teatralidade e na eficaz dialética com as imagens reais, esconde algumas subtilezas e transformam o filme no encontro entre o tableau-vivant da manifestação efémera, e a mais duradoura intervenção nas paredes da cidade e na produção imagética do PCP.
1977 | 6 MIN.
REALIZAÇÃO/DIRECTOR: Célula de Cinema do PCP
“Jornal Cinematográfico Nacional — nº 1, 8, 9 e 16”
O Jornal Cinematográfico Nacional, produzido pelo Instituto Português de Cinema, ainda criado por Marcello Caetano, mas que só começaria a funcionar em 1975, era o terceiro dos três principais jornais ou boletins de atualidades cinematográficas portuguesas, sucedendo, em Democracia, ao Jornal Português (1938-1951) e a Imagens de Portugal (1953-1970). Incorporado no início dos programas das sessões de cinema, antecedendo, juntamente com documentários e filmes de animação, a longa-metragem, o jornal de atualidades funcionava como um resumo dos principais acontecimentos do país para o público das salas de cinema. Veículos da propaganda do Estado, omnipresentes nos meios da imagem em movimento até ao advento da Televisão a partir de finais da década de 1950, os jornais de atualidades constituíam, antes do 25 de Abril de 1974, uma forma do país se ver a si mesmo, ou ver a sua imagem oficial e sancionada, tanto mais que eram encomendados pelo SNI, ou Secretariado Nacional da Informação, sucessor do Secretariado da Propaganda Nacional. Com a paulatina difusão da televisão, o Noticiário Nacional foi tomando o seu lugar, o que explica a curta vida dos jornais cinematográficos na década de 1970. Para quem pretender ver ou estudar as suas imagens, uma advertência se coloca: vê-se o que alguém nos quer dar a ver, como alguém nos quer dar a ver e o que destas imagens querem que seja lido. Ou seja, tudo é criteriosamente selecionado e acompanhado de uma omnipresente narração que confere às imagens o seu sentido oficial.
No democrático Jornal Cinematográfico Nacional as diferenças são ainda poucas do ponto de vista da construção do formato, constituído por pequenas peças de temáticas variadas. O som captado in loco é mais abundante, sobretudo nas coberturas de eventos políticos, mas a presença da narração em algumas peças transporta-nos para um estranho compromisso, em que textos e vozes trazem ainda memórias da retórica oficial do passado. A frescura do trabalho da Unidade de Produção Cinematográfica Nº 1, que sucedia às empresas responsáveis pelos jornais anteriores, é bem patente nos genéricos modernos, veja-se o mais experimental do número 16, e na música de fundo, que se afasta agora da solenidade das fanfarras introdutórias ou da seleção de música clássica que se entorpecia nos boletins do Estado Novo. As imagens são, porém, claramente mais frescas e espontâneas, com uma montagem mais fluída e mais ciosas da experimentação. Abundam, como já acontecia no passado, a autoelegia do cinema, com os operadores que se filmam a si próprios, como que reforçando a voracidade dos caçadores de imagens de um país em plena transformação e de multidões que respiram novos ares. Dos registos oficiais, destaca-se, no número 8, a Sessão de Encerramento da Assembleia Constituinte, a 2 de abril de 1976, pelo Presidente da República, Francisco Costa Gomes, no âmbito da aprovação da nova Constituição da República Portuguesa que entraria em vigor no dia 25 de abril desse ano.
1975 — 77 | 70 MIN.
REALIZAÇÃO/DIRECTOR: unidade de Produção Cinematográfica n.º 1
Apresentado por
Hugo Barreira
20 ABRIL, 21h30
“As Armas e o Povo”
A história do filme AS ARMAS E O POVO começou a desenhar-se no dia 29 de abril de 1974, na histórica reunião na sede do Sindicato Nacional de Profissionais de Cinema, então situada na rua de São Pedro de Alcântara. Nessa segunda-feira, alguns minutos depois das 11 horas da manhã, ao som de gritos “Vitória! Vitória!” e empunhando cartazes (“Os profissionais dos espectáculos apoiam as Forças Armadas”; “Por um Portugal livre/Fim à Censura dos Espectáculos”), os serviços da Censura foram os primeiros a ser ocupados. Daí, uma comitiva menor seguiu para ocupar o IPC e outra para “selar” a Cinemateca nacional e “evitar desvios de material”. Nesse mesmo dia, Fernando Lopes, António-Pedro Vasconcelos, Cunha Telles e “um elemento cineclubista” deslocaram-se ao Palácio da Cova da Moura onde funcionava a sede do Ministério da Defesa Nacional, para garantir o apoio da Junta de Salvação Nacional (JSN) e do Movimento das Forças Armadas. Ao fim do dia, um comunicado da JSN decretava “abolida a censura” ao cinema e à RTP, mantendo apenas uma comissão “ad-hoc” para definir a classificação etária dos espetáculos. De acordo com Fernando Lopes, em entrevista a José Filipe Costa, as reuniões na sede do Sindicato que se realizaram nos dias seguintes serviram “basicamente para organizar o filme”, com Cunha Telles a assumir-se como “elemento importante de coordenação, até pela sua própria experiência de produtor”. De acordo com a revista Cinéfilo de 4 de Maio, foram constituídas dez equipas de rodagem, que se espalhariam pela cidade: Glauber Rocha filmaria no Rossio e na Praça da Figueira (e também estaria em bairros de lata na periferia lisboeta nos dias anteriores); Fernando Lopes ficaria responsável pelas filmagens na Av. Almirante Reis e depois na Av. Rio de Janeiro (filmada do alto de um prédio na Av. Estados Unidos da América), na entrada para o Estádio da FNAT (entretanto rebatizada como estádio 1.º de Maio); Fonseca e Costa, Sá Caetano e Luís Galvão Teles filmariam o interior do Estádio.
Para além de ser um documento histórico incontornável, com imagens inéditas, que retrata o primeiro 1.º de Maio em liberdade, este filme coletivo é também um manifesto sobre a importância do cinema ao serviço da revolução, não apenas como mero difusor dos acontecimentos, mas sobretudo como participante ativo do ato revolucionário. A frequente presença das câmaras de cinema que surgem ao longo do filme, dos próprios cineastas (como Glauber Rocha, Henrique Espírito Santo ou Manuel Guimarães), mas sobretudo as imagens das históricas “ocupações” do dia 29 de abril e da participação de vários membros do Sindicato no desfile do 1.º de Maio, empunhando os cartazes identificativos, ou a célebre imagem da fachada do cinema Império com o cartaz a anunciar a exibição d’ O Couraçado Potempkine, são presenças simbólicas que inscrevem o cinema português nesse momento ímpar.
Paulo Cunha, O Cinema e o Povo (excerto adaptado) in As Armas e o Povo, Cinemateca Portuguesa.
1975 | 81 MIN.
REALIZAÇÃO/DIRECTOR: de Colectivo dos Trabalhadores da Actividade Cinematográfica
Apresentado por
Paulo Cunha
PROMOTOR: CÂMARA MUNICIPAL DA MAIA
ORGANIZAÇÃO: CINECLUBE DA MAIA
COLABORAÇÃO: CINEMATECA PORTUGUESA - MUSEU DO CINEMA, IP
Entrada livre até ao limite do Auditório Venepor que é de 350 lugares sentados, sendo o acesso realizado por ordem de chegada.
Fonte: https://www.cm-maia.pt/institucional/agenda/evento/cinema-ciclo-50-anos-de-25-de-abril
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