O Prémio Pessoa, instituído em 1987, é atribuído anualmente a pessoas de nacionalidade portuguesa que se tenham distinguido como protagonistas na vida científica, artística ou literária. De José Mattoso a Maria João Pires, de Maria Manuel Mota a António e Hanna Damásio, de Eduardo Lourenço a Eduardo Souto de Moura (só para citar alguns dos maiores vultos da arte e ciência portugueses) chegamos a Cláudio Torres (Prémio Pessoa em 1991) e a Tiago Rodrigues (Prémio Pessoa 2019), que se encontram pela primeira vez em Mértola. Neste encontro-debate colocaremos face a face dois homens de gerações diferentes, o arqueólogo Cláudio Torres nascido em 1939 e o encenador Tiago Rodrigues em 1977, ambos com percursos de vida e militância cívica excecionais. Claúdio Torres, fundador e diretor do Campo Arqueológico de Mértola, teve uma vida marcada pela ditadura, pela tortura da PIDE e pelo exílio na África do Norte (Argélia e Marrocos) e na Europa (antiga Checoslováquia, Roménia e França). Regressou a Portugal em 1974 após o 25 de Abril, iniciando, na Faculdade de Letras, um caminho pioneiro para a arqueologia em Portugal. Através do seu trabalho e de dezenas de colaboradores, ano após ano, tem posicionado Mértola como local de relevo na descoberta e investigação arqueológica. Tiago Rodrigues, atual diretor do Teatro Nacional D. Maria II, tem desenvolvido o seu trabalho a partir da cena teatral independente e institucional. É um dos encenadores portugueses com maior difusão internacional e os seus espetáculos têm circulado por todo o mundo. O forte apoio que através de diversos programas de descentralização cultural tem imaginado a partir do Dona Maria II, combinados com uma forte aposta nas novas gerações de atores e encenadores nacionais, tem feito da sua ação uma importante bandeira para as artes performativas nacionais. De que modo pode a arqueologia ser um oráculo para o futuro? De que modo a dramaturgia olha o passado e o atualiza? Como é que disciplinas aparentemente não conectadas se podem relacionar entre si? Qual o papel de cada uma delas para uma análise crítica do mundo atual? Será a partir destas e de outras questões, ancoradas no binómio passado/futuro, que se desenrolará este particular encontro-debate com dois homens notáveis que, por força das circunstâncias, cruzam os seus presentes em Mértola. Isabel Alves Costa, no seu livro “O Desejo de Teatro”, descreve o seu regresso a Portugal, em 1974, após anos de exílio em Paris:“Cantámos durante toda a viagem. Penso que isso nos ajudou a exorcizar a angústia. E se alguma coisa corresse mal? Quando aterrámos em Lisboa pediram-nos para nos mantermos a bordo. (…) Nesse momento, alguém que estava sentado à nossa frente virou-se para nós e disse: - Vocês são a Isabel (Alves Costa) e o Zé Mário (Branco), não são? Eu sou o Cláudio Torres. E, sem nos deixar tempo para responder, desapareceu no meio dos outros passageiros” A vida é feita de encontros, mais ou menos fugazes, em contextos diversos e com simbologias distintas para cada um de nós. Em 1974, este cruzamento de Cláudio Torres com dois dos grandes vultos das artes portuguesas, denota bem o espírito inquieto, curioso e audaz que partilha com Tiago Rodrigues. Estamos certos de que este encontro, que agora se proporciona, também será relembrado em tempos vindouros. Santiago Macias é licenciado em História de Arte, Mestre em História Medieval e doutorado em História pela Universidade de Lyon. Foi professor nas Universidades do Algarve e de Évora e investigador na Universidade de Coimbra. Ligado ao Campo Arqueológico de Mértola desde 1983, dirigiu escavações e foi membro da direção entre 2009 e 2013. Foi assessor na Câmara Municipal de Mértola e de Moura, e assumiu a presidência da Câmara Municipal de Moura entre 2013 e 2017. Santiago Macias assumiu em março de 2021 a Direção do Panteão Nacional.